REQUALIFICAR A UFBA

Jailson Bittencourt de Andrade e Evelina de Carvalho Sá Hoisel

Nos dias 03 e 04 de maio, a Universidade Federal da Bahia irá definir os nomes de seu Reitor e de seu Vice-reitor. O resultado dessa consulta organizada pelos Sindicatos de Professores e de Funcionários, juntamente com o Diretório Central dos Estudantes, deverá ser formalizado pelos Conselhos Superiores da Universidade, no dia 12 do mesmo mês. A comunidade acadêmica poderá escolher entre a continuidade da gestão atual ou contribuir para a construção da mudança; uma mudança sem traumas e sem o agravamento dos conflitos que hoje transtornam a vida acadêmica.

A proposta da nossa candidatura é requalificar a UFBA em suas diversas instâncias e níveis de atuação. Isto determinará uma abordagem imediata de aspectos que consideramos hoje carentes de atenção institucional, como o ensino, principalmente na graduação. Requalificar a UFBA terá como prioridade instaurar – em alguns casos até restaurar – formas de gestão compatíveis com a Universidade. Entendemos que a UFBA vive uma crise de identidade, desde o momento em que passou a privilegiar um projeto de poder, em detrimento do seu projeto de saber. O projeto de poder tornou a UFBA subserviente a políticas governamentais e privadas, até partidárias, sem as discutir criticamente com a comunidade acadêmica, ferindo muitas vezes os interesses da própria instituição.

Essas alianças têm dado visibilidade à nossa Universidade, o que, sob um determinado aspecto, é importante, pois ela precisa ser vista pela comunidade na qual está inserida. Todavia, a predominância de um projeto de poder - que, em alguns momentos, atinge o nível da pura espetacularidade - coloca um sério problema ético-político que é urgente identificar. Os rumos da Universidade são definidos a partir de diretrizes e interesses externos, alheios à especificidade da instituição e à avaliação da sua comunidade acadêmica, que não é convocada para discutir a sua própria atuação e o seu futuro. Com isso, a UFBA vem sendo ferida na sua autonomia e atingida na sua função crítica e questionadora. O seu projeto de saber - isto é, a sua função de produtora de conhecimento e de discurso crítico-reflexivo - foi relegado a um segundo plano.

Atualmente, a situação da infra-estrutura da UFBA expõe essa inversão. A degradação do espaço físico, a carência de professores, de funcionários técnico-administrativos e tantos outros fatores têm provocado uma perda de qualidade. É urgente resgatar essa qualidade. O tecido institucional está esgarçado em seus diversos níveis, inclusive na sua ética.

A prioridade então será requalificar este patrimônio acadêmico e intelectual, fazendo com que a UFBA cumpra efetivamente o seu papel, a partir de uma agenda acadêmica alicerçada no compromisso social e democrático. O compromisso social de uma Universidade requer a sua atuação crítica e reflexiva sobre a sociedade na qual ela se insere. É por este viés, que uma Universidade deve se qualificar como contemporânea, ou imprimir na instituição a marca da contemporaneidade. Mais do que isso! É essencial fazer desse posicionamento a sua base de atuação política e democrática. Não é, portanto, a partir de uma absorção e reprodução dos discursos que circulam na sociedade do espetáculo, com suas estratégias mercadológicas perversas, que a UFBA vai se qualificar como contemporânea. Não é também a partir de uma adesão às variadas políticas governamentais ou partidárias que a UFBA sairá do seu anacronismo.

A própria história da instituição está sendo apagada. É sintomático que, na proposta da UFBA contemporânea que nos é apresentada para os próximos quatro anos, os símbolos da instituição não estejam presentes. Nela, os emblemas da Universidade Federal da Bahia são substituídos por imagens que exibem o colorido festivo de mitos oficiais da baianidade, numa adesão às políticas culturais que sustentam e apóiam as ideologias do capital financeiro e mercadológico; tais ícones e símbolos são hoje espalhados em nossos campi.

Tal apagamento da história é, no entanto, apenas a face aparente de um problema mais profundo. Nas relações que mantém com a sociedade, a Universidade vem perdendo autenticidade. Explicamos: há contradição e distanciamento entre a UFBA do nosso cotidiano e a imagem que se quer construir para a instituição. Entre a UFBA que recebe os seus calouros com um “mega-evento” e a UFBA que esses mesmos calouros vão encontrar no dia-a-dia das suas aulas, existe quase um abismo. A energia investida nessa promoção concentra-se na tentativa de construir uma imagem para consumo externo. Essa UFBA artificial é detentora de vasto capital político; a outra – a Universidade das nossas atividades diárias - nem tanto, fica com as sobras. Por isso, a empresa patrocinadora do “mega-evento” exige nada além daquilo que exigem todos os patrocinadores: a exposição de um nome. Mas, quando dialoga com a UFBA da nossa experiência cotidiana, a mesma empresa exige permuta, de modo que essa UFBA, irmã maltratada da outra, vê-se obrigada a fazer cessão temporária de um prédio, como garantia para a conclusão de outro. Sem correspondência no cotidiano, a “Mega-UFBA” é ilusória, circulando no meio social como miragem. Maltratada, a UFBA das nossas atividades é quem tem substância, lastro na experiência; é ela quem detém o ensino, a pesquisa, a extensão: bases do patrimônio acadêmico que as lutas empreendidas por sua comunidade vêm defendendo ao longo de muitos anos.

A Universidade será tão mais contemporânea, quanto mais for capaz de atuar criticamente, formando cidadãos e cidadãs com uma visão reflexiva sobre o mundo no qual se inserem. Visão crítica e reflexiva não significa assumir uma posição de pura contestação e negação desses valores, ou de acastelamento em torre de marfim; essa postura seria ingênua e anacrônica! A visão crítica da Universidade pode ser traduzida pela capacidade que ela tem para dialogar com as políticas governamentais, neoliberais, expondo para a sociedade a lógica de seu funcionamento, as suas formas de aprisionamento e os mecanismos de atuação desses diversos discursos. Se imprescindível for, incorporá-los, mas exibindo constantemente as suas estratégias de cooptação e o seu jogo de competição.

Reafirmamos que a Universidade em que trabalhamos tem um ritmo diferente da UFBA espetacular que se anuncia. A produção do saber e a conquista das condições para coletivizar esse saber não cedem à lógica do mercado, nem ao jogo da competição. Pensamos que a UFBA não pode abraçar a contemporaneidade justamente a partir desse vetor tão desumano: sujeição às leis do mercado, inserção num processo competitivo, imposição do embuste produzido pela má publicidade. Somos candidatos porque acreditamos que a UFBA precisa ser, pode ser e deve ser uma Universidade de qualidade.

Artigo publicado em A TARDE do dia 21 de abril de 2006.


Manifesto
Exibir perfis dos candidatos
Depoimentos
Programa
Campanha hoje
Entrevista
Agenda
Fale conosco
Download
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Retornar a página inicial