ENTREVISTA

Com uma candidatura voltada para a requalificação da Universidade e a afirmação do seu papel social através do ensino, da extensão e da pesquisa, os professores Jailson Andrade e Evelina Hoisel falam das suas diretrizes de campanha, das suas preocupações administrativas e dos seus posicionamentos políticos. Em entrevista, os candidatos também abordam temas atuais da comunidade acadêmica, como autonomia e expansão universitária, relação com o Governo Federal, direitos de servidores, professores e estudantes. Tratam, também, de políticas afirmativas e inclusivas, além das perspectivas da campanha que já começou e que tem na chapa "Requalificar a UFBA" uma alternativa concreta de mudanças efetivas.

De modo geral, quais as razões e as motivações que levaram o senhor e a professora Evelina a unir forças, compondo esta candidatura à Reitoria da UFBA?

Prof. Jailson - Neste momento nós acreditamos que a Universidade Federal da Bahia precisa de uma agenda acadêmica com foco específico nas suas atividades fins, ou seja, o ensino, a pesquisa e a extensão. Bem como de uma agenda de gestão que promova o trabalho dos gestores em ação articulada com as instâncias decisórias da universidade, especialmente os seus Conselhos. É preciso que se busque acima de tudo uma melhoria significativa na infra-estrutura da universidade, em especial nos cursos de graduação - certamente, a parte menos assistida hoje na universidade.
As agendas acadêmicas e de gestão devem dar sustentabilidade a uma expansão de vagas discentes e a ações voltadas para melhoria da infra-estrutura institucional. Isso é o que nos une, a professora Evelina e a mim, nesta nova jornada. Nós não fazemos parte de nenhum grupo de poder organizado da Universidade Federal da Bahia. A Profa. Evelina tem uma grande experiência de gestão na universidade, em especial como Diretora do Instituto de Letras. No meu caso, tenho experiência de gestão na área de Química e na Pró-Reitora de Pesquisa e Pós-Graduação (1998-2002). A nossa candidatura, tem o objetivo de renovar e requalificar a UFBA como universidade.

Profa. Evelina – É através do foco na agenda acadêmica que se estabelece uma confluência de idéias e reflexões sobre a situação da Universidade Federal da Bahia e que possibilitou essa união forças. Embora eu tenha exercido durante alguns anos atividades administrativas, como a de diretora do Instituto de Letras por oito anos - as questões acadêmicas foram o cerne principal dessa atuação. Pois o compromisso da universidade para com a sociedade, paradoxalmente, a sua atuação política, passa pela produção do saber, e esta produção envolve ensino, pesquisa e extensão. Uma gestão administrativa que não se volte primordialmente para estes distintos níveis da formação universitária pode desqualificar a universidade na sua tarefa de produtora de conhecimento. Focalizar uma agenda acadêmica envolve múltiplos atores e cenários: o compromisso da universidade para com a sociedade, a necessidade de uma infra-estrutura que permita o pleno exercício das suas atividades, a assimilação de tecnologias que garantam a inserção da universidade no mundo contemporâneo.

Quais os principais pontos da candidatura e quais as questões consideradas mais cruciais que dariam o tom da campanha?

Prof. Jailson - No momento, um ponto que precisa de uma atenção grande é a forma de expansão que foi implementada na Universidade Federal da Bahia, que carece de planejamento anterior, como carece de uma visão de curto, médio e longo prazo. Nós visualizamos neste processo a fragmentação da universidade. Reconhecemos, fortemente, que a Bahia precisa de vagas públicas no ensino superior público. Reconhecemos, fortemente, que o governo federal tem um débito com o estado da Bahia. É um dos poucos estados entre os 10 maiores do país que durante muito tempo só tinha uma universidade federal e certamente precisa de outras universidades federais e de um aporte financeiro maior. Nós defendemos que sejam criadas novas universidades, ao invés de novos campi. Esses campi servem de escoadouro de vagas docentes com relação aos cursos já existentes. Podem estar inclusive penalizando a universidade em relação a recursos e infra-estrutura. Então a criação de novas universidades é de extrema importância desde que não prejudique a manutenção e o desenvolvimento da Universidade Federal da Bahia. A avaliação deste sistema de expansão acoplado à ampliação de vagas é certamente o primeiro dos nossos grandes focos.

Outra questão crucial é a infra-estrutura de pesquisa, ensino e extensão. Boa parte da estrutura física da universidade tem mais de 20 anos. Algumas das unidades não foram concebidas para o fim que elas se propõe atualmente, especialmente em relação às atividades de pesquisa e de extensão, pois não têm uma configuração adequada. A área construída da universidade cresceu muito pouco, ao passo que as suas atividades de ensino, pesquisa e extensão cresceram bastante nos últimos 20 ou 30 anos. Nesse sentido, nós acreditamos que a infra-estrutura precisa de uma grande atenção. Tanto na infra-estrutura física quanto na infra-estrutura de pessoal. Especialmente, quanto ao seu quadro docente que precisa ser recomposto. A UFBA tem mais de 500 professores substitutos e há mais de cinco anos que não temos abertura de vagas para professor titular. A universidade precisa tanto de novas vagas para professores em início de carreira quanto para professores titulares que consolidem uma carreira. O corpo técnico administrativo precisa de um plano de carreira que primeiro garanta chances de melhorar sua qualificação técnica em vários níveis e garanta que essa melhoria na qualificação seja utilizada no acesso a posições na carreira profissional. Em resumo, nós imaginamos que no momento em que o quadro técnico tiver uma situação que lhe permita melhorar a qualificação e permita que isso seja utilizado no preenchimento de cargo na Universidade nós estaremos dando uma nova dimensão para esta categoria tão importante para universidade.

Profa. Evelina – Acreditamos que uma expansão não planejada fragiliza mais a universidade. Precisamos de professores, de recursos, mas a abertura de vagas e a aplicação dos recursos, a partir da expansão que se impõe na UFBA, passam a ser redirecionados em decorrência da implantação de novos campi. Assim, temos uma questão que precisamos refletir. Ainda que se trate de um projeto com uma dimensão mais ampla, um projeto que não é da UFBA, porém, do governo federal, precisamos pensar o modo como ele vem sendo implementado e em que medida efetivamente qualifica a nossa universidade. Será que temos que acatar todos os projetos que nos são apresentados? O que pensa a comunidade universitária sobre a expansão para o interior? Ela foi suficientemente discutida do ponto de vista acadêmico? O estado da Bahia precisa sim de mais universidades públicas, como já colocou o Prof. Jailson, mas o modelo que se impõe será o melhor?

Como o sr. e a sra. vêem as políticas inclusivas para a Universidade, tais como a questão das quotas ou a necessidade da abertura de cursos noturnos voltados para trabalhadores e outros segmentos sociais , por exemplo?

Prof. Jailson – “Políticas afirmativas” é uma das questões mais sensíveis e que fazem parte hoje da agenda do país e como não poderia deixar de ser, faz parte da agenda da Universidade Federal da Bahia. O Brasil tem um débito social imenso e precisa de ações eficientes para mitigar as distorções e garantir a cidadania plena dos brasileiros, sejam eles moradores do centro, da periferia, do litoral ou do interior do País. A UFBA reflete em tamanho menor, as distorções e débitos sociais do Brasil. Entretanto, neste aspecto a Universidade Federal da Bahia já avançou e criou um programa de quotas inclusive bem mais ambicioso que o esta sendo discutido pelo Governo Federal. O sucesso e a manutenção deste programa de quotas necessitam de uma série de ações que venham consolidar e aprimorar esse sistema. Uma é diversificar as ações de apoio aos estudantes, outra que se coloca, é a situação do estudante trabalhador. Nós precisamos obviamente avançar bastante no oferecimento de cursos noturnos de qualidade. Ocupar os campi da UFBA, abrir cursos noturnos. Esta é uma das formas de expandir as vagas que beneficiarão a sociedade. É de grande relevância a criação de programas que garantam a permanência destes estudantes na UFBA. Não basta modificar o acesso. É urgente a implementação de ações efetivas de apoio ao estudante que esteja na Universidade, seja ele oriundo de quotas ou não, e que garanta a este estudante cidadania plena para que possa freqüentar e concluir o seu curso. Então acreditamos que “políticas afirmativas” precisam ir além da fronteira do ingresso. Neste momento estas abordam prioritariamente o ingresso do estudante. Creio que precisamos abordar a ampliação de vagas e a garantia que estes estudantes sairão da universidade diplomados e não ampliando a evasão que já é grande.

Profa. Evelina – Além dos aspectos já abordados pelo Prof. Jailson, chamo a atenção para a questão da implantação dos cursos noturnos. A sua criação não requer somente a construção de uma grade curricular adequada. Há uma série de providências que envolvem infra-estrutura física e administrativa, segurança, funcionamento de bibliotecas, transporte no campus. Do ponto de vista acadêmico, projetos já estruturados para cursos noturnos têm tido problemas no momento de sua aprovação nas diversas instâncias das unidades universitárias por não se ter garantida a implementação de uma série de medidas que devem acompanhar a sua instalação. O curso noturno é um ponto muito importante no nosso projeto e sabemos que ele requer toda uma mobilização para que possa efetivamente funcionar. A universidade deve se preparar para garantir o seu funcionamento e, principalmente, a eficiência desses cursos.


Em relação às políticas educacionais no País, como o sr. e a senhora analisam a atual conjuntura e os caminhos tomados pelo Governo Federal?

Prof. Jailson - A esperança em relação ao atual governo era muito mais ambiciosa do que se revelaram as suas ações. O governo Lula tem uma origem sólida no meio acadêmico. Boa parte do PT tem grandes conexões no meio acadêmico e nós esperávamos que tivesse uma ação mais efetiva na educação. O resultado visível é o terceiro ministro da Educação em três anos e a própria reforma do ensino superior que esperávamos que fosse uma reforma de estado, se revela muito mais uma política de governo, com viés partidário muito forte. Deste modo, o governo Lula certamente está em débito com o meio acadêmico. A expectativa era muito maior. Inclusive este plano de expansão das universidades não fazia parte do programa do governo e não fazia parte do programa do primeiro ministro da Educação. E isso acabou surgindo quase que do nada. Se por um lado a Universidade Federal do ABC é implementada diretamente, na Bahia são criados campi da UFBA! Por outro lado, o Governo Federal tem um débito com os estudantes, com os servidores técnico-administrativos e com os docentes das universidades. Aos estudantes falta uma política de apoio, pois não existem recursos específicos para essa finalidade, uma reivindicação histórica da categoria. O corpo-técnico administrativo ainda não tem uma carreira organizada e isso é um débito claro. Enquanto que o corpo docente ainda vive claudicante em relação à remuneração e ao seu próprio plano de carreira. Então, eu diria que o débito do governo Lula é grande porque as expectativas eram bem maiores e foram frustradas.

Quais os principais problemas hoje da Universidade Federal da Bahia ?

Prof. Jailson - Creio que a falta do olhar pela Universidade Federal da Bahia e para a Universidade Federal da Bahia. A nossa sensação é que a visibilidade da universidade e a ação externa para garantir esta visibilidade tomaram conta praticamente de toda a agenda e faltou um olhar intra-muros para a UFBA. A falta desse olhar intra-muros se reflete numa carência de política de gestão para a Universidade, que inclua o seu funcionamento e a sua expansão. Nós já apontamos que a política de expansão carece de planejamento. No momento em que uma parte ou um dos focos principais da universidade carece de planejamento, isso prejudica todo o andamento do sistema. O que nós observamos é uma ação conflituosa em relação aos estudantes. Os estudantes levaram seis meses em greve com uma agenda de reivindicações internas e não uma agenda externa a universidade. Então, eu creio que nesse momento o principal desafia da UFBA é olhar para UFBA e ter uma agenda pela UFBA.

Quais os preceitos e princípios, na opinião dos sr. e da sra., que devem permear hoje a Universidade e que delimitam o seu papel em relação ao mundo e ao contexto atual ?

Prof. Jailson - Creio que um princípio que consolida tudo o que nós já falamos é a autonomia da Universidade. Nos últimos anos a UFBA ficou muito atrelada à políticas externas, principalmente a políticas do Governo Federal. Não estamos dizendo que a ressonância com o governo não possa ou deva existir - muito pelo contrário – ela é essencial. Mas, no nosso caso, a UFBA absorveu diretamente essa política sem nenhuma discussão crítica, de como isso reflete e como impacta na Universidade em curto, médio e longo prazos. Isso fere fortemente a autonomia universitária. A Universidade precisa ter antes de tudo uma visão crítica e, segundo, ser laica. Ela não pode ter uma religião de preferência, um partido político preferencial, nem um time de futebol preferencial. Quando falamos na necessidade da Universidade ser suprapartidária queremos ressaltar que ela não deve se atrelar a nenhum partido político, seja de esquerda, de centro ou de direita. A UFBA precisa ter capacidade de se relacionar e criticar qualquer um deles. Isso não significa, de forma alguma, uma despolitização. Muito pelo contrário, defendemos uma ação é política com autonomia e sem assimilar determinada especificidade partidária. A UFBA precisa exercer plenamente o seu papel crítico.

Profa. Evelina – Hoje, esta questão me parece crucial na nossa universidade. Como espaço de produção do conhecimento e do saber, ela precisa ter esta autonomia, o que lhe garante o pleno exercício da crítica. O grande impasse da universidade pública hoje é esse: poder exercer sua função crítica em relação às políticas que circulam no contexto histórico no qual ela está inserida. Entretanto, parece que cada vez mais a universidade assimila, sem discutir. Então, a nossa universidade precisa fortalecer a sua capacidade crítica, requalificar-se enquanto discurso crítico, aberto ao diálogo e à interlocução. A Universidade precisa formar sujeitos pensantes, cidadãos e cidadãs que reflitam sobre o presente, que pensem criticamente a sua inserção na história, que sejam capazes de redimensionar o passado e projetar o futuro de forma mais consciente.


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Fala da Profa Evelina Hoisel no debate em Direito